quinta-feira, 29 de maio de 2008

35. A SURPRESA

- Bom dia! – disse Bia chegando junto de Joana.
- Estás atrasada! – resmungou a amiga.
- Estou a ver que estás bem disposta. – ironizou ela.
- Desculpa, não dormi bem esta noite. – disse Joana.
Estavam à porta de sua casa. Joana estava à espera de Bia já há algum tempo porque ultimamente não andava a dormir bem. Desde que soubera que eles iam voltar a Portugal que andava de mau humor. Como é que eles se atreviam? Ela tinha recuperado tão bem. Estava tudo a correr lindamente. Ele não podia arruinar todo o esforço, não podia!
Caminharam até à escola onde se encontraram com Luís. Bia despediu-se, indo directa para os cacifos. Joana começava a desconfiar de algo mas naquele momento não estava disposta a investigar. Quedou-se sozinha com Luís.
- Então as aulas estão a correr bem? – perguntava ele, tentando meter conversa.
- Sim. – respondeu ela.
- E os trabalhos são fáceis? – continuava ele, nervosamente.
Ela percebeu o que ele estava a tentar fazer.
- Podes perguntar. – disse Joana.
- O quê? Do que estás a falar? – perguntou Luís, tentando desvalorizar o assunto.
- Podes perguntar como é que eu estou a lidar com a vinda deles para Portugal. Eu sei que tu sabes. – respondeu-lhe ela.
Ele percebeu que ela não estava zangada e aproveitou a deixa para obter a resposta que queria.
- E então como é que estás a lidar?
- Vou indo. – respondeu-lhe Joana ambiguamente.
Luís não fez mais perguntas, até porque não sabia o que significava aquela resposta. Deixou Joana à porta da sala de aula e prosseguiu.

- Home, sweet home! (Lar, doce lar.) – dizia Leonor a Georg, no aeroporto de Lisboa.
- Where is Tom? (Onde está o Tom?) – perguntou Gustav.
- He’s with his bags. The police is searching him because he’s considered a suspect. (Está com as malas dele. A polícia está a revistá-lo porque ele é considero suspeito.) – disse Bill, visivelmente farto de estar ali.
Na área reservada do aeroporto, encontrava-se a banda e Leonor, à espera para poderem sair. Só podiam ir todos juntos, uma vez que os seguranças estavam à espera. A vinda dos Tokio Hotel a Portugal tinha sido anunciada há uns dias e já tinha provocado a histeria na maior parte das fãs. Há muito que algumas já sabiam o voo e o hotel em que iam ficar e se preparavam para o grande ataque.
- I’m back! (Voltei!) – disse Tom, enfiando-se para a sala, fechando a porta imediatamente atrás de si.
- Oh dear little brother… I thought you were already in jail. (Oh querido pequeno irmão… Eu pensava que já estavas na cadeia.) – ironizou Bill.
- I couldn’t leave you here. (Não te podia deixar aqui…) – respondeu-lhe Tom, na brincadeira.
Depois de terem todas as malas na carrinha e de a segurança estar toda pronta para mergulhar naquele mar de fãs, lá saíram todos da sala, com Leonor mais atrás para não dar nas vistas. Esta podia ver muitas raparigas a agarrarem o seu baixista preferido e por pouco não saltou para cima de algumas. A meio do caminho também precisou de segurança, não para não ser atacada, mas sim para não atacar.

Bia tinha chegado a casa contente. Finalmente o seu admirador tinha marcado o tão esperado encontro. Iria ser no próximo fim-de-semana. Estava felicíssima com aquilo, quando o seu telemóvel tocou. Antes sequer de ler a mensagem, ao ver o número de Leonor sem o indicador internacional, ia tendo um ataque. Foi com as mãos a tremer que abriu e leu a mensagem.
Já estou em Portugal. Estou a morrer de saudades vossas. Amanhã no café do costume para pôr a conversa em dia.
Naquela noite, Bia mal dormiu. Não estava triste por Leonor ter regressado, antes pelo contrário. Tinha a sua amiga junto dela, neste momento que ela tanto precisava. Mas sabia que se Leonor estava de volta, também Bill estava, significasse isso o que quer que significasse.

Joana acordou cedo naquele dia. Era Bia que a ia buscar a casa e sabia que ela ultimamente queria chegar cedo à escola. Quando Bia chegou, já Joana estava vestida e de mala feita, à sua espera.
- Então, hoje não tens pressa? – perguntou Joana, metendo-se com ela.
- Mais ou menos. Olha, tenho uma surpresa para ti. – disse ela, sem grande entusiasmo.
- O que é? – perguntou Joana curiosa.
- Depois vês… - afirmou Bia.
- Não estejas tão entusiasmada que isso até pode fazer mal. – brincou a amiga
Prosseguiram a viagem até ao café do costume. Joana não reparou mas o carro de Leonor estava estacionado na lateral no café. Bia, por sua vez, reparou e bem. Ao vê-las entrar no café, Leonor deu um pulo e correu em direcção a elas. Bia deixou-se levar, melancolicamente, e Joana estava demasiado espantada para ter qualquer reacção. Quando, ao fim de alguns minutos, Leonor se afastou, Joana pôde olhar para Bia com um ar desesperado; ela encolheu os ombros pois não havia nada que ela pudesse fazer.
A cabeça de Joana fervilhava mas tinha que sair dali; deu como desculpa ter a boca a saber a pasta de dentes e foi à casa de banho. Bia ficou à mesa com Leonor. Era preciso contar-lhe a verdade, agora que ela já estava em Portugal. Com muito custo, lá começou.
- Leonor, temos de falar. É sobre o que aconteceu à Joana. – disse Bia, lentamente.
E disse tudo. À medida que ia falando, o sorriso na cara da amiga ia-se desvanecendo. A alegria fugia-lhe e dava lugar à incredulidade. Quando acabou, Leonor estava sem palavras.
Na casa de banho, Joana chorava. Não precisou de perguntar para saber que eles também já estavam em Portugal. Agora que ela estava bem, eles voltavam… Ele voltava… Sentiu o telemóvel no bolso a vibrar. Tremulamente, tirou-o. Foi lavada em lágrimas e com algumas desta a caírem-lhe no telemóvel, que ela leu a mensagem.
Surprise: I’m in Portugal! Whem can I see you? (Surpresa: Estou em Portugal! Quando te posso ver?)
Joana continuou a chorar. Ainda mais, claro.

To be continued…

domingo, 25 de maio de 2008

34. O REGRESSO

- Danke schön Berlin! (Obrigado Berlin!) – gritava Bill pelo microfone.
Bill, Tom e Georg foram os primeiros a abandonar o palco. Gustav ficou mais uns minutos, fazendo uns solos para descomprimir. Depois juntou-se aos amigos.
Na sala do backstage, Leonor já os esperava. Ultimamente costumava assistir aos concertos no corredor à frente do palco, destinado à imprensa. Com a tua máquina fotográfica em punho, tentava sempre captar o melhor momento, a fotografia perfeita. Naquele dia, o concerto tinha sido maior que o habitual. Era a despedida da banda para umas merecidas férias de poucas semanas. Estavam todos bastantes cansados com esta agitação toda: agora fartavam-se de viajar para a América e as horas que passavam em voo eram bastantes desgastantes.
- I can believe that we’ve done it! Some many concerts… (Eu não acredito que conseguimos! Tantos concertos…) – queixava-se Bill.
- I’m so tired. – dizia Gustav, estendido no chão.
Tom, ajudava o baterista que estava cheio de cãibras. Georg tinha-se estendido em cima do sofá, com a cabeça pousada no colo de Leonor.
- What are we going to do now? (Que vamos fazer agora?) – perguntou ele sem levantar a cabeça.
Ninguém estava com paciência nem disposição para pensar, mas Bill respondeu imediatamente:
- We are returning to Portugal. (Vamos regressar a Portugal.)
Georg e Leonor levantaram-se mal Bill acabou a frase; Tom e Gustav apenas de limitaram a olhar para ele.
- You heard. Let’s do the break in Portugal. (Vocês ouviram. Vamos fazer a pausa em Portugal.) – anunciou ele.
- When do we leave? (Quando partimos?) – perguntou Gustav, começando a ganhar forças novamente.
- In a couple of days. (Num par de dias.) – informou.
Um elemento do stafff meteu a cabeça na porta e informou que as carrinhas estavam prontas para os levar ao hotel. Gustav levantou-se; Bill deixou-se ficar para trás e puxou Tom.
- Nicht sagen Joana. Ich werde erklären Sie später. Ok? (Não contes à Joana. Eu explico-te depois. Ok?) – pediu Bill.
- Ja. (Sim.) – disse Tom, confiando no irmão.

- Despacha-te! Ainda vamos chegar atrasadas por causa de ti. – resmungava Bia.
- Espera! Não posso ir de qualquer maneira, não achas? – dizia retoricamente Joana.
- Mas tu não ias levar a roupa que tinhas escolhido ontem? – perguntava Bia, ao entrar no quarto pela décima quinta vez.
- Não gostei de me ver. Que achas desta? – inquiriu Joana, com os cabides na mão.
- Perfeita. Veste. – respondeu Bia, sem olhar.
- Não sejas assim. Tu deves ter demorado séculos para escolher essa camisola vermelha, além disso, ainda é cedo. – finalizou a amiga.
Lá se vestiu e arranjou, com Bia a contar cada segundo que passava. Era o primeiro dia, depois da recuperação, que Joana ia à escola. No dia anterior tinha perdido horas a escolher a roupa; tirara tudo para fora para desespero da mãe.
- Pronto, estou pronta. – anunciou.
- Até que enfim. Vamos. – disse Bia, puxando por ela e desaparecendo pela porta.
- Até logo mãe! – despediu-se Joana.
- Quero-te em casa depois das aulas. Não andes por aí! – gritou a mãe da cozinha para ela ouvir.
Encontraram-se com Luís de minutos mais tarde, no café do costume. Joana apercebeu-se que Luís tinha-se tornado cliente do café. Pediram os pequenos-almoços e ficaram à conversa:
- Pronta para o regresso? – perguntava Luís.
- Sinto-me como se fosse o primeiro dia de aulas em que não conheço ninguém e todos vão olhar de lado. – respondeu Joana, visivelmente nervosa.
- Não te preocupes. É normal que alguém olhe de lado; depois do escândalo que a Bia fez com o Salvador começaram a correr rumores. – informou ele.
- Nada que ele não merecesse ou que não fosse verdade. – disse Bia, sem o menor remorso.
Vieram os cafés e as torradas. Joana saboreou aquele farnel como pela primeira vez; como se quisesse lembrar-se daquele sabor para sempre. Bia comeu tudo em menos de segundos, quando acabou, ainda de boca cheia, disse:
- Vou pagar. Tenho de ir para a escola.
Segundos depois desapareceu pela porta de entrada, deixando Luís e Joana ainda pasmados de espanto. Na verdade, Bia ia directamente para o seu cacifo, esperar pela rosa. Ainda não sabia quem era o remetente mas estava prestes a descobrir. Este deixara-lhe um bilhete a perguntar se ela queria encontrar-se com ele: caso quisesse, deveria levar naquele dia uma camisola vermelha. Por isso, quando Joana disse que ela devia ter demorado séculos a escolher aquela camisola, Bia corou interiormente.
No café, Luís e Joana tinham acabado de pagar e dirigiam-se para a escola. Luís tentava amenizar o espírito com conversas banais sobre temas banais. Joana apenas acenava com a cabeça; na verdade, esta estava bem longe dali, fervilhando nervosamente. Foi quando passaram pelo portão de entrada, que Joana o viu.
Ele, como se soubesse que um olhar fulminante se cravava na sua nuca, virou-se e viu-a. Joana estagnou naquele lugar. Ela e Salvador olhavam-se fixamente. Era a prova de fogo para Joana. Sentiu os seus joelhos a ceder e como já conhecia aquela sensação, fugiu dali, quebrando o olhar. Fugiu para os bancos do jardim, com Luís a segui-la imediatamente.
- Estás bem? – perguntou ele quando pararam.
- Acho que sim. – respondeu ela, ofegante.
- Sabes que vais ter que o encarar todos os dias, não sabes?
- Sei. – voltou a responder.
Fez-se silêncio.
- Queres ir já? – questionou novamente Luís, alguns minutos depois.
- Devagar.
E lá foram, devagar, para a escola. Já tinha tocado, por isso não restava ninguém no pátio. Luís acompanhou Joana até à sala e, só depois de se certificar que ela entrara, é que seguiu para o seu pavilhão. Bia já estava nervosa ao ver que Joana não estava presente, mas quando esta entrou, pôde respirar de alívio.
As aulas daquele dia seguiram-se normalmente. Devido à ajuda de Luís e Bia, Joana não perdera muita matéria e sentia-se à vontade nas aulas. Nos intervalos, ficavam os três sempre juntos; secretamente, Bia e Luís tinham combinado não deixar Joana sozinha para a sua própria segurança. Chegara o final das aulas e eles encontraram-se mais uma vez.
- Então como correu o dia? – perguntou Luís.
- Bem, apenas onze pessoas me olharam de lado. – ironizou Joana, meio a sério, meio a brincar.
- Vão andando que eu já vou apanho lá fora. – disse Bia.
Eles não disseram nada. Ambos achavam que ela andava muito estranha, mas se ainda não tinha contado anda era porque não queria. E tinham razão: Bia não contou nada porque queria ter mais pormenores para poderem falar. Correu até ao cacifo, na ânsia de encontrar uma resposta à camisola vermelha. E não se desiludiu: um bilhete esperava-a lá dentro.
Marcarei o nosso encontro para breve.
Um sorriso de felicidade encheu a cara de Bia. Guardou cuidadosamente o bilhete e foi ao encontro dos amigos. No caminho, sentiu o telemóvel tocar. Meteu a mão ao bolso, tirou-o e leu a mensagem. Rapidamente o sorriso se esvaiu da sua cara. Ficou pálida. Joana e Luís viram-na ao longe e acenaram-lhe. Ela foi até eles, caminhando mecanicamente.
- Ai rapariga, de tão branca que estás até parece que viste um fantasma. – brincou Joana.
- Não vi, mas vou ver… - disse seriamente Bia.
Os outros perceberam que se tratava de um assunto sério e mudaram as suas expressões.
- Que é que se passa? – perguntou Luís.
- Os Tokio Hotel… - começou Bia.
O coração de Joana acelerou rapidamente.
- O que é que eles têm? – disse ela impacientemente.
- …vêm para Portugal. – concluiu Bia.

To be continued…

quinta-feira, 22 de maio de 2008

33. O GELADO

- Wake up! (Acorda!) – dizia ele. – Nônô, wake up! (Nônô, acorda!)
Georg abanava-a mas ela teimava em continuar com a cabeça debaixo das almofadas. Rindo-se, Leonor emitia sons estranhos de preguiça. Ele, que também já tinha alinhado na brincadeira, começou a fazer-lhe cócegas. Não demorou muito até que ela pulasse da cama.
- Ok, ok, you won. (Ok, ok, ganhaste.) – disse Leonor, rendida.
Ela e Georg juntaram-se a Bill, Gustav e Tom, que conversavam animadamente sobre o último concerto. Falavam calorosamente quando Leonor sentiu o telemóvel no bolso a tocar. Depois de ler a mensagem, Leonor ficou mais recatada. Georg reparou e foi falar com ela.
- Is she again? (É ela outra vez?) – perguntou.
Leonor acenou que sim com a cabeça. Nos últimos dias, tinha recebido mais mensagens de Portugal do que era habitual. As notícias não eram boas: Joana tinha estado muito em baixo e quase correra perigo. Leonor vivia aflita à distância, sempre com medo de ler a mensagem que lhe ia dar uma má notícia. Georg tinha partilhado a sua dor e acalmava-a nos momentos mais difíceis; ela já tinha ponderado seriamente regressar a Portugal.
Porém, aquela mensagem não era má, antes pelo contrário, era o início de alguma esperança, por mais pequena que fosse: Joana tinha aceitado que tinha um problema e ia começar a tratar-se. No final do texto, era Bia quem fazia um apelo: volta para junto de mim, preciso de ajuda.
Mal mostrou a mensagem a Georg, este olhou-a para tentar perceber o que ela ia fazer. Iria embora e deixá-lo? Leonor também percebeu o que se passava na cabeça de Georg e tranquilizou-o.
- Don’t worry. I won’t leave you, even if you want to! (Não te preocupes. Eu não te deixo, mesmo que quisesses!) – brincou ela.
Ele riu-se.
- I’ll talk to Bill. I’ll explain him what’s going on. (Vou falar com o Bill. Eu explico-lhe o que está a acontecer.) – garantiu Georg.
Deu um beijo a Leonor. Esta ficou a vê-lo ir falar com Bill. Desapareceram os dois para outra sala para poderem falar mais à vontade. Leonor ficou a falar com Bia e a explicar-lhe que não podia ir embora.

No quarto de Joana, Bia estava sentada na cadeira do computador e Joana estava deitada na cama a ver televisão. Sempre que podia, Bia gostava de ficar lá para apoiar a amiga. Tinha sido uma grande luta e temeu mesmo pela vida da amiga. Agora que ela tinha aceitado tratar-se, Joana teve que fazer uma pausa nos estudos. Bia concordava que era o melhor até porque não se ia cruzar com Salvador; não que isso agora fosse problema. Poucos dias depois de saber que era ele que estava a conduzir Joana para aquele caminho negro, Bia fez um escândalo na escola: disse-lhe tudo o que tinha a dizer no meio da escola. Claro que Salvador nunca mais pôde ver Bia à frente e manteve-se afastado de Joana pois a amiga disse que o denunciaria caso ele voltasse a aproximar-se.
Quem tinha ficado mais amigos delas, era Luís. Tinha sido uma peça vital na resolução deste problema. Quando não podia estar com Joana, Bia trocava de turno com ele. Trabalhavam a vez e iam relatando a matéria a Joana para que ela não perdesse o ano. Naquele dia, Bia esperava por ele, pois tinha que ir fazer um trabalho. Enquanto ele não vinha, falava com Leonor.
- Estás a falar com quem? – perguntou Joana.
- Ah... Com a minha mãe. – mentiu.
Bia não queria que ela pensasse em Bill e tinha medo que só o simples facto de referir que estava a falar com Leonor, pudesse influenciar.
- Nem sabia que a tua mãe sabia mandar mensagens... – disse Joana, desconfiada.
- Pois, aprendeu há pouco tempo.
Bia sentiu um enorme alívio quando Luís entrou pela porta do quarto. Guardou as coisas e despediu-se de Joana. Esta ficou sozinha com Luís.
- Então, está tudo bem? Vida boa, sempre na cama. – brincou ele.
Joana estava realmente feliz com este novo amigo. Tinha-a ajudado imenso e estava sempre a fazê-la rir.
- Queres trocar? Não me importo. Estou farta de estar aqui fechada. – desabafou ela.
- Sabes que ainda é muito cedo para saíres. Tens que estar completamente boa para seres lançada novamente aos leões. – ironizou ele.
Ela riu-se e atirou-lhe com uma almofada.
- Mas eu queria tanto sair um bocadinho, nem que fosse só para ir à esquina comer um gelado fora da validade e voltar. – disse Joana, brincando também.
- Está bem, convenceste-me. Eu vou falar com a tua mãe e pedir. Veste-te ou queres ir em pijama? – perguntou Luís.
Nem precisou de repetir; Joana saltou da cama e expulsou-o para se poder vestir. Abriu a gaveta e começou a escolher a roupa. Quando puxou de uma camisola, caiu ao chão um envelope. Ela baixou-se para apanhá-lo. Sabia bem o que estava lá dentro. Tinha guardado o passaporte de Bill ali no dia em que o recebeu. Nunca mais tinha olhado para ele. Rapidamente o guardou e tentou afastar as más recordações que ele lhe trazia. Vestiu-se e foi à sala ter com Luís. Deu um beijo à mãe e, depois de algumas recomendações, lá saíram.
Mal pôs os pés na rua, sentiu o ar fresco a bater-lhe na cara; nunca o tinha sentido assim talvez até porque nunca tinha tido falta dele. Joana fez menção de ir para o café da rua mas Luís impediu-a.
- Anda antes a outro sítio – disse ele.
Ela seguiu-o sem questionar. Tinha a certeza que ele sabia o que estava a fazer. Andaram durante uns minutos e foram ter ao parque infantil, o mesmo que Joana já havia estado uma vez.
- Pronto criancinha, brinca lá à vontade. – disse ele.
Ela riu e correu para o baloiço. Sentou-se e chamou-o. Àquela hora e num dia de semana, ninguém estava no parque, excepto eles. Luís aproximou-se dela.
- Vá, não saias daí que eu vou ao café buscar os gelados. Queres de quê? – perguntou ele.
- Pode ser de morango.
Enquanto esperava, ficou a baloiçar-se e tentou não pensar na última vez que ali estivera. Felizmente, Luís não demorou muito.
- Toma o teu. – disse ele, passando-lhe o gelado dela.
- Obrigada.
Joana devorou o gelado dela e ainda acabou o de Luís. Ele ria-se com ela: parecia uma criança que vinha pela primeira vez à rua. Notou que ela estava diferente, muito diferente da Joana que era.
- Vá, empurra-me! – ordenou ela.
Ele riu-se. Lá foi empurrá-la.
- Já viste, foste dar uma volta maior que à esquina e os gelados estavam dentro da validade e tudo! Diz lá que eu não sou o maior?
- Sim, sim... – disse, a rir-se.

Georg e Bill tinham regressado da sala. Foram os dois sentar-se junto de Leonor. Esta percebeu, pela cara de Bill, que ele já sabia da história toda. Nem precisou de falar; foi ele quem falou primeiro.
- We are returning to Portugal as soon as we can. (Vamos regressar a Portugal assim que pudermos.) – anunciou Bill.

To be continued...

terça-feira, 20 de maio de 2008

32. O LIMITE

Alguns dias tinham passado e Joana tinha-se tornado uma cliente assídua de Salvador e do uso de óculos de sol. Bill continuava a enviar-lhe mensagens a contar-lhe a sua vida. Era como se Joana fosse o novo diário confidencial de Bill Kaulitz: a nova estrela em ascensão mundial! Ela, Joana, não podia fugir a esta profissão: ele era uma estrela e não corria o risco de ficar sem saldo no telemóvel. Todos os dias era atacada por mensagens. A sua única fuga era Salvador. Por várias vezes saia de casa à noite dizendo que ia a casa de Bia; na verdade ia-se encontrar com ele. Tinha subido a parada e estava cada vez mais viciada. Dia sim, dia sim encontrava-se com ele para comprar mais “daquilo”. Salvador estava a desempenhar bem o seu papel, salvando-a das suas crises.
Joana estava muito diferente e a própria Bia já tinha reparado nisso. Uma vez, durante uma aparente caminhada pacífica para a escola, a conversa começara:
- O Bill voltou a falar comigo ontem. Diz que tu continuas a não lhe responder. Eu pensava que já tinhas dinheiro, vi-te a falar ao telemóvel ontem à tarde. Bem, o que ele queria era… - começou Bia.
- Eu não quero saber o que ele queria! Pára de me chatear! Estou farta de tudo, desta porcaria toda! – disse, aos gritos, Joana.
E nesse dia, faltou às aulas. Ficou com os seus cigarros, que já eram muitos. Cada vez mais sozinha e incompreendida: era assim que Joana se sentia. Longe, muito longe, ia aquela Joana, fã cega dos Tokio Hotel, que bastava ver os seus ídolos num canto minúsculo duma capa de revista para a comprar. Hoje, todo o dinheiro que juntava era gasto directamente no supermercado de Salvador.
Naquele dia, Joana tinha-se levantado cedo para se encontrar com ele. Tinha decido que era melhor assim; Bia já andava desconfiada e por várias vezes já a apanhara a falar com ele. Viu-se obrigada a dizer que estava apenas a perguntar as horas.
Estava quase a chegar à escola quando foi intersectada por Luís.
-Olá, bom dia. Já reparaste que hoje não fomos um contra o outro? – disse ele, metendo-se com ela.
- Bom dia. Pois foi, andamos a melhorar. – disse, rindo-se.
- Então, estás melhor daquilo? – perguntou ele, timidamente.
Ela não percebera a primeira, teve que pensar no último encontro para se lembrar dos cigarros caídos ao chão.
- Ah… Sim, não comentes com ninguém. É apenas uma fase… - disse, um pouco insegura.
Ele percebeu que não devia tocar mais no assunto e assim o fez. Despediu-se calorosamente e foi-se embora. Joana continuou o seu percurso até Salvador. Foi encontrá-lo no local combinado.
- Então miúda, parece que ainda tens muitos problemas…
- Não tens nada a ver com isso. Tens aí ou não? – perguntou Joana, não oferecendo confiança.
- Sim, sim tenho. Mas olha que tenho algo ainda melhor, é experimentar para crer. São novos. – disse ele, estendendo um pacote com comprimidos.
Joana ficou relutante em aceitar: estaria a ir longe de mais? Quando sentiu o telemóvel no bolso a vibrar resolveu aceitar. Pagou e foi-se embora.

Várias semanas tinham passado e o vício de Joana estava cada vez a aumentar mais rapidamente. Bia já não sabia o que fazer: a amiga não lhe contava nada e a mãe desta já a tinha chamado vezes sem conta para ir lá a casa pois Joana estava cada vez mais incontactável.
Bia por sua vez, estava no meio de uma aventura. Todos os dias era presenteada com uma rosa no seu cacifo, remetida por um anónimo. Ela bem se fartava de olhar à volta mas não via ninguém que conhecesse e que fosse capaz de lhe ofertar tal prenda. Um dia até chegou a ir para a escola mais cedo; de nada adiantou: mais uma vez a rosa estava lá à sua espera.

Eram quase horas de sair de casa para ir para as aulas e estava Joana a acordar. Desde que começara a tomar os comprimidos de Salvador que piorara bastante. Emagrecera a olhos vistos, andava sempre agarrada e já nem falava a ninguém. Bia já tinha descoberto; ao ver Joana a dormir num banco de jardim, Luís correu a contar a Bia. Esta prontamente se dispôs a ir falar com Joana e a ajudá-la mas ela nem a quis ouvir. Argumentou que ela não sabia o que se passava. Desde então, Bia quase nunca conseguira voltar a falar-lhe; sempre que a via, Joana virava para o lado contrário da estrada.
Finalmente lá saiu de casa, arrastando os pés para andar. Estava com a cabeça tão pesada que só lhe apetecia voltar para a cama. Preferia sair por causa da mãe: sabia que se ficasse em casa ela ia começar a dar-lhe sermões. No bolso tinha comprimidos suficientes para aquela semana por isso não se precisou de encontrar com Salvador. Foi directa para a escola. Talvez por ainda ir um pouco a dormir, talvez por estar pedrada de mais, Joana não reparou em Bia e quando a viu não teve reflexos suficientes para se desviar.
- Anda cá. Hoje não foges. – disse Bia, agarrando Joana por uma braço e arrastando-a para a casa de banho das raparigas.
- Larga-me, estás a aleijar-me! – resmungou ela, retirando o braço.
Bia largou-a e encostou-se à porta para que ninguém entrasse enquanto elas falavam.
- Ora bem, tu não queres admitir o que se passa mas tens que ver que estás a ir por maus caminhos, Jô! Tu já nem pareces tu. Estás a dar cabo de ti. – disse Bia.
- Eu não te pedi conselhos! – atirou Joana, furiosamente.
- Mas vais ouvi-los! Eu sei por aquilo que estás a passar e o Salvador não te ajuda! Ele não é teu amigo. Na primeira vez que tu não lhe pagues ele deixa-te. Ele não é amigo de ninguém a não ser do dinheiro. Acredita no que eu te estou a dizer. – advertiu ela.
Joana ficou calada.
- Eu não sei o que te levou a procurares o Salvador mas eu sou tua amiga, podes contar comigo. Fala, conta-me o que se passa. É alguma coisa com o Bill não é? Ele continua a mandar-me mensagens a dizer que tu não respondes. – disse Bia, à cautela.
Joana continuou calada.
- Se não queres responder, não respondas. Só acho que não vale a pena isto tudo. E… toma. Fica aqui isto para ti. – disse ela, estendendo um envelope, que deixou em cima do lavatório.
Saiu e fechou a porta. Joana mal sentiu a porta bater, levantou-se e abriu o envelope. Não queria acreditar. Não podia ser, pensava ela. Nas suas mãos estava o passaporte perdido de Bill Kaulitz. O passaporte supostamente roubado a Bill, mas que afinal era Bia quem tinha. Como é que ela poderá tê-lo durante este tempo todo sem lhe dizer nada? Naqueles momentos Joana não conseguia pensar em mais nada. Não sabia se havia de sentir raiva ou amizade por Bia.
Meteu a mão ao bolso, tirou uns comprimidos, meteu na boca e bebeu água. Guardou o passaporte na mala e saiu. Devia ter tocado pois já não havia ninguém nos corredores. A meio do pátio, Joana começou a sentir-se mal mas continuou a andar. A cada passo que dava sentia as suas pernas a perderem força e os seus olhos a não verem claramente o caminho. Conseguiu passar o protão; pensou que se ia sentar nos bancos e descansar um bocado. Mas, antes mesmo de chegar aos bancos, Joana perdeu as forças e caiu no chão.
Ao longe, Luís vinha para a escola, atrasado por causa do trânsito. Viu um vulto caído no chão e não hesitou em socorrer. Correu até ele e então percebeu quem era.
- Joana! Joana acorda! – disse ele, dando-lhe pequenas bofetadas na cara.
Era inútil. Ela estava tão pedrada que nada a fazia abrir os olhos. Tinha atingido o limite. Luís não teve outra opção senão enviar uma mensagem a Bia, mesmo sabendo que esta estaria nas aulas.
Vem rápido. A Joana está mal. Estou com ela no jardim ao lado da escola. Não sei o que fazer.
E ali ficou, com Joana nos braços, à espera de ajuda.

To be continued…

domingo, 18 de maio de 2008

31. OS ÓCULOS

Joana levantou-se com o despertador a tocar. Desligou-o com uma valente pancada; ainda se sentia meio aluada e nas nuvens. Deu uma rápida olhadela ao telemóvel; continuava em cima da mesa-de-cabeceira. Não lhe tinha respondido; não sabia se por não saber o que dizer, se por não lhe querer falar.
Arranjou-se para a escola; se havia alguém que ela naquele dia não queria encarar era Salvador. Passou uma última vez pelo espelho e assustou-se. Tinha os olhos vidrados, espelhados e brilhantes. A inquietação e o medo apoderaram-se dela: iam reparar e descobrir o que ela tinha feito! Foi obrigada a arranjar uma solução; foi à mala e tirou os óculos de sol. Ignorou o facto de serem oito da manhã e de não estar sol.
Saiu de casa evitando encarar a mãe. Pelo caminho atrasou-se de propósito para não ter que se encontrar com Bia no café, pois assim iria que tirar os óculos. Esperou por ela do lado de fora, e seguiram juntas para a escola.
- Não tiras os óculos? – perguntou Bia, desconfiada.
- Não, dormi mal e tenho olheiras. É para disfarçar. – mentiu Joana.
Ultimamente já tinha perdido as contas às vezes que mentira.
- Olha, sabes quem me mandou uma mensagem ontem? – perguntou Bia.
- Quem? – disse, distraidamente, Joana.
- O Bill.
Joana parou de repente. Como é que ele se atrevia a atacá-la daquela forma? Ir falar com as suas amigas? Era ir longe de mais.
- Ai sim? – disse ela, tentando mostrar desinteresse.
- Sim, ele disse que te mandou uma mensagem mas que tu não lhe respondeste. Eu disse que não devias ter dinheiro… - afirmou Bia.
- Sim, não tinha. – outra mentira saída da boca de Joana.
Entraram juntas para a escola. No corredor, e para desespero de Joana, cruzaram-se com Salvador. Ele poderá não ter tido a certeza se ela olhou para ele, uma vez que estava de óculos de sol, mas teve a certeza do porquê dos óculos de sol. Devido a isso, não evitou o comentário provocante:
- Está um sol dos diabos…
Joana fingiu que não ouviu e Bia ignorou-o. Na sala de aula, Joana preferiu sentar-se nos últimos lugares, para que ninguém visse os seus olhos, já que dentro da sala era obrigada a tirar os óculos.
Ia a aula a meio, quando o telemóvel de Joana vibrou, no bolso. Com cuidado para que ninguém visse, ela tirou-o.
Don’t smoke! (Não fumes!)
O coração de Joana acelerou o suficiente para ela achar que naquela sala todos o conseguiam ouvir. Não fumes? Mas ele agora também era omnipresente e sabia o que ela fazia? Como tinha ele descoberto? Decidiu que naquele momento já podia “ter dinheiro” para lhe responder.
What do you mean? (O que é que queres dizer com isso?)
Segundos mais tarde, e depois de muita impaciência, recebeu a mensagem com a resposta.
You were always saying that, remember? (Estavas sempre a dizer isso, lembras-te?)
Oh… Afinal era só isso. Ainda ninguém tinha descoberto o seu segredo. Decidiu responder-lhe; concluiu que não podia deixar de lhe falar de repente.
Yeah, I remember. (Sim, eu lembro-me.)
Respirou de alívio, pensou que já se tinha livrado dele. Estava enganada.
I miss you. Despite the fact that we were always fighting, I miss the time we spent together. (Eu tenho saudades tuas. Tirando o facto de que estávamos sempre a discutir, eu tenho saudades do tempo que passámos juntos.)
Pronto! Tinha-o conseguido outra vez: atingira o coração de Joana. Como é que ele tinha a capacidade de fazer aquilo? Como é que ele ainda conseguia mexer tanto com ela? Ela que já sabia como era a vida dele, o vedetismo, o estrelato…
Tocara para sair e Joana apressou-se. Sabia o que queria mas precisava de se livrar de Bia.
- Tenho de ir à tipografia tirar umas cópias de uns apontamentos. Vai andando para o bar. Vemo-nos daqui a pouco?
- Sim, claro. Até já. – disse Bia.
Joana ficou a ver a amiga entrar no bar e depois foi procurá-lo. Sabia que o podia encontrar pelos corredores, junto do seu grupo de amigos suspeitos. Depois de uns minutos a procurar e de umas voltas dadas, encontrou-o. Salvador falava com um rapaz sobre um encontro qualquer quando viu Joana. Não precisou que esta o chamasse. Despediu-se do amigo e foi ao encontro dela.
- Então miúda, está assim tanto sol que nem tiras os óculos? – disse ele, metendo-se com ela.
Joana tirou os óculos e meteu-os na cabeça. Salvador nem precisou de perguntar, riu-se.
- Sempre resolvi os teus problemas? – perguntou ele.
- Ainda não. Preciso de mais. Sou uma rapariga de grandes problemas. – disse ela, sarcasticamente.
Ele parou de se rir. Olhou para ela de cima a baixo como se a estivesse a observar; depois disse.
- Não. – e virou as costas.
Ela ficou perplexa. Quando recuperou, seguiu-o.
- Não? Como não? Tu estavas sempre a dizer que resolvias e agora não? Mas o que é que te deu? Pensei que aquilo que se dizia de ti fosse verdade, mas pelos vistos não passas dum menino que só tem é fama. – disse ela, provocando-o.
Salvador parou de repente. Joana soube que tinha conseguido o que queria.
- Tu não passas de uma miúda por isso não me venhas dizer o que eu sou ou não sou. E a resposta é não. Acredita que é um favor que te estou a fazer. – respondeu-lhe ele.
- Favor? Favor? Tu não sabes sequer o que é me fazeres um favor! O que é que tu queres? É dinheiro? É? Toma, fica com todo, trata-me como outra pessoa qualquer. – disse ela, atirando notas para o chão.
Ele olhou para o chão e em seguida para ela. Encontrou nos seus olhos um desespero, uma impaciência pela sua resposta. Viu que ela estava mesmo a falar a sério. Meteu a mão ao bolso e tirou de lá um saquinho idêntico àquele que tinha dado a Joana da primeira vez. Ela agarrou-o e apanhou as notas do chão e estendeu-lhas. Antes de ele dizer qualquer coisa, veio-se embora. Vinha tão nervosa que decidiu não ir ter com Bia ao bar; em vez disse, foi aos bancos de jardim que ficavam ao lado da escola. Ia tão nervosa e distraída, que nem reparava por onde ia. Já do lado de fora do portão, esbarrou contra um rapaz, deixando cair o saquinho que levava enrolado na mão.
- Temos de deixar de nos encontrar assim. – disse o rapaz.
Joana olhou finalmente e reconheceu-o. Era o mesmo contra o qual ela já tinha esbarrado uma vez.
- Luís, não é? – perguntou, tentando lembrar-se do seu nome.
- Sim, é. Joana, certo? – disse Luís.
- Certo. – confirmou ela.
- Deixa-me ajudar-te. – disse ele, quando reparou no pequeno pacote que Joana havia deixado cair.
Ela seguiu o olhar dele e também percebeu. Apressou-se a apanhá-lo e despediu-se.
- Bem, tenho que ir. Até à próxima.
Deixou Luís ali, ainda sem palavras por ver aquela rapariga com aquilo. Joana prosseguiu para o jardim: agora mais do que nunca precisava de usar o que Salvador lhe arranjara. Tinha acabado de chegar aos bancos, quando o seu telemóvel tocou de novo.
You didn’t answered me! (Tu não me respondeste!)
Nem tencionava responder-lhe.

To be continued…

segunda-feira, 12 de maio de 2008

30. A EXPERIÊNCIA

Joana chegou a casa ainda nervosa. Aquele encontro que ela tinha planeado para devolver o saquinho ainda pairava na sua cabeça: mas porquê é que não tinha devolvido? O que se tinha passado com ela? Para que é que queria aquilo?
Não pensou mais no assunto e meteu-se num banho cheio de espuma, mas antes ligou a aparelhagem no CD de sempre. O Scream começou a toca com aquele ritmo que ela tão bem conhecia. Mergulho os pés na água quentinha e um arrepio percorreu-lhe a espinha. Deitou-se lá dentro e fechou os olhos. Deixou-se escorregar. Na sua mente pairava a imagem de Bill, um Bill perfeito, sem tiques de estrela. Estava toda mergulhada dentro de água; por um breve momento pensou: e se ficasse ali? E se não emergisse? E se se deixasse ficar?
Um Scream fê-la voltar à tona. Olhou à volta à sua procura mas não viu ninguém. Estava, inevitavelmente só.

Longe, muito longe dali, na Alemanha, no estúdio, Bill, Tom, Gustav, Georg e Leonor estavam todos sentados a ver televisão. Gustav brincava com as palhinhas do sumo, como se fossem baquetas. Tom e Georg, sempre na brincadeira, faziam do chão um tapete de luta e embrulhavam-se em amigáveis socos e murros. Leonor e Bill, mais calmos, riam-se daquela situação toda. Para meter conversa, foi Bill quem começou.
-So, do you like being here? (Então, gostas de estar aqui?) – perguntou.
- Yeah, but I miss my country too. (Sim, mas eu também tenho saudades do meu país) – disse ela.
- I know how it feels. (Sim, eu sei o que isso é) – afirmou Bill.
Leonor ficou a pensar nos momentos dos quais já tinha saudades: as amigas, as manhãs passadas no café, o seu irmão chato que ela tanto gostava… Mas claro que estar ali era maravilhoso. Estava a ter a oportunidade fantástica de viver num país estrangeiro, aprender novas culturas e línguas, de estar com quem ela gostava. Sim, esta era a melhor parte: estar com Georg. Agora que se conheciam melhor, sentia-se cada vez mais confiante na decisão de ter deixado tudo por embarcar na viagem. Bill interrompeu a sua linha de pensamentos.
- I kind of miss Joana. She was always saying stop doing that or don’t do this… (Eu até tenho saudades da Joana. Ela estava sempre a dizer pára de fazer isso ou não faças isto…) – disse Bill, melancolicamente.
Leonor riu-se, não ligando ao que ele dizia. Neste momento, Tom e Georg estavam num concerto de guitarras imaginárias. Era difícil descobrir qual ganhava, mas Tom garantia que era ele.
- Ja, ja, Tom. (Sim, sim, Tom) – dizia Georg.

De volta a Portugal, Joana saia do banho, enrolada na toalha. Tinha o cabelo molhado solto pelas costas, escorrendo dele pequenas gotas de água gélida. Correu depressa para o quarto e abriu a gaveta para tirar o pijama. Tinha lá guardado o saquinho para ninguém ver. Retirou o pijama e deixou a gaveta encostada. Vestiu-se e sentou-se na cama. Ficou a olhar para a gaveta mal fechada. Apenas e só apenas por um instante uma ideia lhe passou pela cabeça: e se aquilo resolvesse mesmo os problemas? Ela já tinha visto Bill a fumar...
Não! Não podia ser. Lutou contra si mesmo para resistir à tentação. Mas, e se só experimentasse? Já tinha visto imensas pessoas lá na escola e além disso, Bill fazia-o. Quase que apostava que Bia já tinha experimentado.
Levantou-se e foi ao corredor. Não ouviu ninguém: a mãe devia estar na cozinhar e o pai na sala. Fechou a porta com cuidado e abriu a janela. A noite estava clara e via-se perfeitamente a lua. Foi à gaveta e tirou de lá a embalagem transparente. Procurou na mesinha de cabeceira uns fósforos que tinha ali desde os seus anos e que usara para acender as velas do bolo. Acendeu o fósforo. Pegou num cigarro e colocou-o na ponta dos dedos. Acendeu-o ali mesmo, sem o levar a boca. Viu o fogo a queimar as pontas do papel e das folhas. Tremendo, levou-o à boca.
As primeiras inalações misturaram-se com a inexperiência mas, ao fim de um bocado, já não engolia o fumo. As mãos deixaram-lhe de tremer, sentiu a cabeça a ficar mais leve, a pensar menos nos problemas. Quando acabou, guardou o resto dos cigarros na gaveta dos pijamas novamente. Pronto, já tinha experimentado. Não haviam palavras para descrever a situação. Sentiu o telemóvel vibrar no bolso.
Olá Jô! Quantas saudades! Já vou aprendendo um pouco de alemão mas tenho que ir falando português sozinha para matar saudades. Temos que combinar uma hora na net as três para estarmos juntas. O Bill diz que tem saudades tuas! Vai dando notícias. Leonor
E depois de ler a mensagem, principalmente a frase referente a Bill, teve necessidade de repetir a experiência, que agora já deixara de ser experiência.

To be continued...

quinta-feira, 8 de maio de 2008

29. O SAQUINHO

Despediu-se de Bia e voltou para o seu quarto. Tinham falado com Leonor sobre os acontecimentos dos últimos dias: segundo ele estava a ser fantástico. Bia ficou contente, ao contrário de Joana. Ainda pensava naquelas palavras...
Agarrou o papel, agora com cuidado, e tirou-o do bolso. Olhou para o número e tirou o telemóvel sem pensar.
É só fama ou resolves mesmo os problemas?
Enviou. No preciso momento em que carregou enviar caiu em si: o que estava ela a fazer? Tinha ela chegado até esse ponto? Por causa dele, a estrela? O telemóvel vibrou, ela abriu a mensagem.
É experimentar para saberes, miúda.
Mas...? Como é que ele sabia que era ela? Ela nem tinha assinado! Resolveu não responder; se ele lhe dissesse algo na escola fingia que não tinha sido ela. Porém, resolveu guardar o número no telemóvel, não fosse ele mandar-lhe uma mensagem a perguntar quem era e ela não se lembrar e responder...
Nessa noite, demorou a adormecer mas pensou que era porque estava calor. Noite estranha aquela, pensava Joana.

Ao outro dia, acordou cheia de sono. Tinha ficado acordada até tarde mas agora tinha sono. Foi preciso vir a mãe reclamar com ela para se levantar que o pequeno-almoço já estava na mesa a arrefecer, para Joana se levantar. Esticou a mão para dentro do armário e apanhou qualquer coisa ao acaso. Vestiu-se demoradamente e lá foi para a cozinha comer.
Acabou por sair de casa alguns minutos mais tarde do que devia. Devido a isso e ao facto de já ter passado o autocarro, teve de ir a pé para a escola. O resultado foi um atraso e a perda da primeira aula. Ainda assim, correu até ao portão. Também a chegar ao mesmo tempo, Salvador esbarrou contra Joana ao tentarem passar o portão ao mesmo tempo.
- Ai! – disse ela, deixando cair a mala para o chão.
- Vinhas com pressa de me ver, miúda? – perguntou ele.
Joana percebeu que ele estava a referir-se. Decidiu manter a decisão que tinha tomado: não se ia descair.
- Para te ver? Porque que raio é que eu te queria ver? – disse com firmeza.
O olhar que Salvador fez foi suficientemente esclarecedor para Joana perceber que tinha cumprido o seu objectivo. Salvador tinha uma olhar de dúvida, com o sobrolho levantado, o que lhe dava um ar ainda pior do que o que ele já tinha.
- Deixa lá então... Devo estar a fazer confusão. Vais lá para as aulas. – disse ele apanhando a mala dela e devolvendo-a.
Joana saiu dali a andar, feliz. Tinha conseguido! Aquele dia já estava a correr bem, apesar do atraso. Entrou na sala e pediu licença para assistir ao resto da aula. Depois de entrar, viu que só tinha lugares nas cadeiras da última fila. Não se importou: tinha reparado que Bia já lá estava e falavam depois: a aula estava a acabar. Preparava-se para tirar o caderno quando reparou. Dentro de uma saquinho de plástico transparente, estavam uns cigarros que pareciam ter sido feitos manualmente. Joana assustou-se: o que era aquilo? Dela não era com certeza... Quem poderia ter posto... perguntava-se ela quando se lembrou! Salvador! Ele tinha apanhado a mala de propósito e colocado aquilo lá dentro! Afinal não o tinha convencido. Mas se ele pensava que ia sair a ganhar, enganava-se: Joana tencionava categoricamente devolver-lhe aquilo e avisá-lo que se a voltasse a incomodar fazia queixa. Sim, era isso que ela ia fazer.
Felizmente tocou e Joana preparava-se para ir ter com Salvador quando foi intersectada por Bia.
- Hei! Onde é que vais? – perguntou ela.
- Ah... A lado nenhum. – mentiu Joana.
Bia acreditou: Joana estava a ficar cada vez mais convincente.
- Olha, ontem ainda falei com a Leonor quando cheguei a minha casa. Acho que eles eram para partir ontem mas como o Bill inventou para lá algo, acabaram por só ir hoje. – anunciou Bia.
- O que é que ele inventou desta vez? – perguntou Joana, curiosa e com medo.
- Não sei bem, acho que foi qualquer coisa com o microfone que ele andava à procura. Parece que mandou abrir as malas de transporte dos materiais para ter a certeza que estava lá. E acho que os autocarros já tinham as malas arrumadas na bagageira!
Joana ficou ainda mais espantada: ele tinha chegado àquele ponto? Mas que Bill era aquele? Ele não sabia que o mundo não gira à volta dele? Não sabia ele que as pessoas que trabalham não são seus escravos?
- Jô! Estás aí? – perguntou Bia ao ver a amiga na lua.
- Sim, o que foi? – respondeu Joana.
- Tenho de ir tirar umas cópias a papelaria. Vens?
- Não, tenho de ir para casa. Até amanhã. – mentiu Joana, mais uma vez.
Queria ir por o seu plano do Salvador em prática. Só teve de o procurar pelo recinto da escola. Foi encontrá-lo junto do seu grupo, alguns populares da escola, outros com ar suspeito. Salvador reparou que ela se aproximava e manteve uma expressão impávida. Parecia que esperava que algo acontecesse a qualquer momento. Joana dirigi-a confiante, mas a cada passo que dava lembrava-se mais das palavras de Bia: “mandou abrir as malas de transporte...”. Sentia o corpo a abrandar. De repente, parou em frente a ele. Ninguém disse nada; Salvador teve a certeza do remetente da mensagem, Joana teve a certeza de que ele tinha tido a certeza.
Agarrou o pacote no bolso e preparava-se para lho entregar mas algo a deteve. Era agora ou nunca! Do que é que ela estava à espera? Era só entregar-lhe. Joana voltou a agarrar o pacote. Recomeçou a andar em direcção a casa, preferindo fazer o percurso a pé ao invés de apanhar o autocarro. A sua mão continuava a agarrar o saquinho.
Salvador ficou a vê-la até ela desaparecer da sua vista, ainda sem expressão.

To be continued...

sexta-feira, 2 de maio de 2008

28. O PAPEL

Sentiu o telefone tocar no seu bolso. Não pôde ver pois estava na aula e não queria ser apanhada. Esperou pelo intervalo.
Hoje às oito na net.
Bia encheu-se de felicidade. Correu até à fila de trás, onde Joana ainda estava a arrumar as coisas da aula.
- A Leonor! A Leonor disse que nos encontramos hoje na net com ela. Às oito! – gritou eufórica.
Joana nem precisou de pensar duas vezes. Bill. Estaria ele lá? Teria Leonor alguma mensagem dele? Teria ele pensado nela?
- Jô! Está aí alguém? A Leonor, hoje! – chamou-a Bia.
- Ah... Sim, claro. Hoje às oito na net.
- Vem só ali à casa de banho comigo, se faz favor. – pediu Bia.
Lá foram; Joana, longe, pensava em Bill: ter-se-ia ele lembrado dela? Entraram na casa de banho mas estava cheia; àquela hora as conversas das raparigas passavam todas por ali.
- Eu espero cá fora, é melhor. – sugeriu Joana, ao ver que nem tinha espaço para colocar os pés.
Bia entrou e ela ficou sozinha. Encostou-se à parede e emergiu de novo nos seus pensamentos mais absortos. Só pensava nele; estava a começar a dar cabo dela.
Foi por estar a pensar em Bill que não viu Salvador chegar.
- Já andas a cair pelo chão da escola? Andas mesmo mal miúda! – disse ele, provocador.
Joana olhou para cima. Teve para se levantar, mas achou que ele não valia o trabalho.
- Deves ter muito que ver com isso. – respondeu ela, desprezando-o.
- Não digas isso... Olha que pela boca morre o peixe... – retornou ele.
Joana parou para pensar. Pela boca morre o peixe? O que é que ele quereria dizer com isso? Como ela não respondeu, ele preparou-se para ir embora, embora não deixando de dizer a sua última deixa:
- Tens aqui – atirando-lhe um papel com um número. – Se precisares de alguma material, eu para ti faço desconto.
Joana ficou ali, novamente sozinha, com o papel na mão. Bia saiu da casa de banho e foi encontrá-la petrificada no mesmo sítio.
- Que se passa? Que papel é esse? – perguntou, curiosa.
- Nada. Era apenas de um rebuçado que estava a comer. – disse Joana, guardando o papel.
- E estás a guardar? – perguntou novamente.
- Ah... É para depois deitar para o lixo. Agora não há aqui nenhum. – disse Joana.
E lá foram as duas juntas, para casa. Quando passaram pelo primeiro caixote do lixo, Bia nem se lembrou do papel. Joana, essa, lembrou-se; não sabendo muito bem porquê, resolveu guardar o dito.
Chegadas a casa, ficaram a fazer tempo até às oito. Jantaram por lá, no quarto de Joana com a parede preta. Passaram bastante tempo a olhar para ela, evitando falar uma com a outra. Faltam quinze minutos para a hora marcada quando foram para o computador. Antes de mais, varreram todos of Fóruns e Blogs. Quando reparam Leonor já estava a falar com elas.
Leonor diz: Olá meninas!
Joana diz: Olá! Olha a Bia está aqui.
Leonor diz: Que saudades que eu já tenho vossas! Está aqui um frio que vocês nem imaginam.
Joana diz: E a banda, como está?
Leonor diz: Bem, eles andam atarefados com os concertos e isso. O Bill...
Joana diz: O BILL O QUÊ?
Leonor diz: Anda aqui num desassossego à procura do seu microfone cinzento brilhante.
Joana diz: É só isso? Ele não disse mais nada? Diz-lhe olá por mim...
Leonor diz: Já disse. Não, ele não disse nada. Devia ter dito?
Joana diz: Não, nada.
Bia tomou o teclado e continuou a conversa com Leonor. Joana foi-se recostar na cama para não cair. NADA? Era isso que ela era? Sentiu a raiva a apoderar-se dela e a fúria a consumi-la por dentro.
No bolso do casaco, Joana agarrou com força aquele pedaço de papel.

To be continued...